Ultima atualização 13 de outubro

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Novos produtos e serviços fomentam a inovação no setor de seguros

O mercado de seguros vai deixando para trás a pecha “conservadora”, oferecendo ao consumidor soluções digitais e personalizadas integradas a recursos inovadores

EXCLUSIVO – Impossível negar a realidade. Toda conveniência e segurança propiciadas pelo universo digital reinante vêm determinando um novo olhar do mercado segurador, e isso vale tanto para a forma como empresas e corretores se dirigem ao cliente bem como para o momento em que se idealizam e, posteriormente, implantam-se novos produtos para um consumidor que, hoje, faz da digitalização sua ponte irreversível com o mundo. 

Divulgado este ano, o estudo 2023 Insurance Shopping Annual Report: Trends, Insights and Predictions, da americana TransUnion, aponta que a pressão sobre a lucratividade das seguradoras registrada ao longo do ano passado permanecerá até o final deste ano. A mesma pesquisa revela, contudo, aspectos da digitalização que vêm mudando a maneira como os consumidores interagem com toda a indústria de seguros, exigindo cada vez mais personalização de produtos, certamente um dos pontos desafiadores para as seguradoras daqui para frente. 

As principais tendências reveladas pelo estudo da TransUnion incluem problemas de lucratividade, que estão forçando as seguradoras em vários países a reavaliarem, entre outros pontos, seus planos de marketing e de subscrição, a digitalização em todo o ciclo de vida da apólice — que está atendendo às expectativas de uma geração crescente de canais de vendas digitais, enquanto ainda se permite o tão importante toque humano nesse processo — e, por fim, novas tecnologias e fontes de dados não tradicionais emergentes, que estão tornando o processo de políticas de negócios — e isso envolve, sobretudo, novos produtos e precificação — mais precisas, eficientes e equitativas.

O relatório também enfatiza que 91% dos consumidores entrevistados estão dispostos a usar canais online como parte da experiência de compra em seguros. Essa tendência se refletiu em todas as linhas de apólices, até mesmo no seguro de vida, principalmente no pós-pandemia, quando a jornada com o cliente assumiu-se definitivamente digital. Enquanto apenas 10% dos consumidores realizavam suas compras de seguro de vida online, ressalta o relatório, esse número saltou para 40% no ano passado. Neste ano, avaliam os especialistas, a realidade parece ainda mais determinada pelos canais online.

“Já havia um movimento natural, mas ainda muito lento de digitalização dos produtos e serviços, ou seja, os canais tradicionais antes da pandemia representavam mais de 80%. Com a pandemia, entregar os produtos e serviços de forma digital passou a ser um movimento de sobrevivência do mercado segurador”, afirma o diretor Comercial e Marketing da Europ Assistance Brasil, Rogerio Guandalini.

A recomendação dos técnicos da TransUnion é que as seguradoras se concentrem em tornar a experiência de compra do consumidor ainda mais digital. Ou seja, um caminho sem volta. Uma maneira de fazer isso, dizem eles, é elevar o nível da experiência de admissão e inscrição em diferentes canais e cenários. Por exemplo: essas empresas podem criar excelentes experiências de entrada e aplicação digital coletando informações do cliente por meio de formulários de autoatendimento intuitivos, apresentando-se a eles com mais facilidade e, consequentemente, manterem o ímpeto da jornada, entregando inscrições e documentos importantes via texto SMS e, por fim, incorporando documentos sempre via online, ou por plataformas na internet ou por aplicativos de celular. Essas etapas podem melhorar a experiência do cliente e reduzir as taxas de abandono durante a jornada com o cliente.

Mas há gargalos, e não são poucos. Embora os recursos de segurança possam conflitar com a capacidade de oferecer uma experiência sem atrito ao cliente, muitos consumidores de seguros estão revelando que se sentiriam mais confortáveis com medidas adicionais de autenticação e verificação. Há outros estudos que mostram existirem, hoje, 50% de consumidores que expressam vontade de se submeterem a verificação adicional para garantir uma cotação online, enquanto 43%, em média, abandonariam o aplicativo caso o considerassem sem segurança. Para atender a essa realidade, as seguradoras devem incorporar medidas rigorosas de verificação e autenticação nas jornadas de entrada dos dados do consumidor e da assinatura eletrônica do cliente, recomendam expressamente analistas de mercado.

A adoção de tecnologia vem, definitivamente, transformando a vida dos usuários, da economia e dos mercados, e o setor de seguros não é exceção, como avalia o presidente da Chubb Seguros, Leandro Martinez. “Na Chubb sempre investimos em tecnologia de ponta, em termos de modelagem de negócios, avaliação de riscos e infraestrutura. Especificamente na oferta digital, há muitos anos investimos na criação de uma unidade de negócios digitais, que está se expandindo rapidamente em termos de receita, produtos e capacidades, com cerca de 200 plataformas e instituições financeiras nativas digitais, especialmente na Ásia e América Latina. Este negócio tem 20 milhões de apólices digitais ativas e acesso a mais de 375 milhões de clientes. Em 2022, produzimos cerca de US$ 500 milhões em prêmios brutos por meio dessas plataformas digitais. Ou seja, o interesse no chamado seguro integrado, ou embedded insurance, que hoje é uma novidade, já é uma realidade para a Chubb e para muitos de nossos sócios comerciais, sejam empresas tradicionais ou fintechs”, diz Martinez.

Desde 2020, a seguradora opera o Chubb Studio, uma plataforma global de distribuição de produtos digitais. “Nesse novo mundo, ser capaz de entender a real necessidade dos clientes e identificar ofertas que fazem sentido em cada momento de suas vidas será chave para o sucesso das empresas. A adoção de tecnologia capaz de viabilizar uma abordagem baseada em dados permite criar uma experiência de contato com ofertas de seguro sem atritos e amigável em cada jornada de compra dos clientes. Falando do ponto de vista dos processos, a adoção de tecnologia também é chave para redução e controle de sinistralidade. Além das medidas mais óbvias, como o aperfeiçoamento dos processos de rastreamento e controle de mercadorias, entre outras, poderemos contar com a implementação de novidades mais sofisticadas. Um bom exemplo é a recente aliança que a Chubb firmou com a insurtech Tryger e a Tive, empresa líder em serviços de visibilidade de logística de transporte com sede em Boston, para fornecer proteção abrangente de transporte de mercadorias para empresas na América Latina. A parceria começou pelo México, mas deve ser estendida para os demais países da região em breve”, revela Martinez, assinalando que, por meio dessa aliança, as empresas da América Latina poderão contratar online, 24 horas por dia, sete dias por semana, um seguro de transporte combinado com um serviço de monitoramento que utiliza tecnologia IoT (internet das coisas) de última geração para rastrear a localização e condição da mercadoria em tempo real, enquanto ela está em trânsito. “Através da Tryger, o seguro de transporte pode ser contratado até 90 minutos antes da saída da carga”, explica o presidente da Chubb.

Um novo olhar e mudança de rumo

Em meio a esse contexto tão complexo e desafiador, criar novos produtos para atender um consumidor tão exigente e pontual induz o mercado de seguros a pendurar o velho e amarrotado roupão do conservadorismo, que, reconheça-se, usou-o ao longo de décadas, e o esqueça por lá, e para sempre. “Com o surgimento da onda de fintechs e insurtechs, que inovaram os canais de venda e produtos, as seguradoras perceberam que precisavam sair da sua zona de conforto para se manterem relevantes”, diz Ricardo Stamato, diretor de tecnologia, transformação digital e inovação da Confitec, uma empresa criada em 2003 para dar suporte tecnológico a toda indústria securitária no país.

Mas há quem acredite que a pandemia foi o momento crucial para essa transição. Como é o caso do diretor de desenvolvimento de negócios da eBaoTech para a América Latina, Weliton Costa. “Sabemos que sempre em ocasiões adversas aparecem as oportunidades, e não foi diferente com a pandemia. Com o temor de sair para rua, as empresas tinham que buscar uma forma de manter-se atuantes e chegar aos seus clientes de maneira mais virtual. Com isso, as empresas sabiam que necessitavam criar produtos e serviços inovadores e digitais, onde a facilidade e poder de decisão ficasse muito mais na mão do cliente quando comparado com os formatos anteriores. Claro, neste momento, a criatividade na elaboração dos produtos teve um peso muito grande e somente a tecnologia poderia ajudar neste desafio”, pondera Costa.

Gerente associado sênior e líder de seguros da Peers Consulting & Technology, Heitor Marin assinala dois pontos nessa mudança de postura das seguradoras nos últimos dez anos: o primeiro deles foi a percepção do avanço tecnológico proporcionado pelas insurtechs, que apresentavam soluções flexíveis para atender aos clientes; o segundo aspecto é a mudança de comportamento do consumidor, com gerações mais jovens integralmente familiarizadas com a compra online. “Esses dois grandes momentos balançaram as estruturas das seguradoras mais tradicionais”, enfatiza o executivo.

CEO da PDVBox, Luis Henrique Forster vai além. Ele observa que o movimento da Superintendência de Seguros Privados (Susep) em criar o Sandbox demonstra essa necessidade do mercado em se mexer, em “sair da inércia”, em criar soluções novas para um “mercado tão antigo”, como pontua o executivo. “Temos acompanhado muito o movimento das seguradoras, e nos anima perceber o nível de mudança na grande maioria. Novas formas de se ver a mesma coisa, criação de área de inteligência, para de fato começarmos a usar dados e conhecimento para traçar o futuro. Tudo isso passa por uma mudança muito real que aconteceu na forma de se ofertar seguros pelos canais digitais. Ouvimos por muitos anos a expressão ‘não tem como vender seguro de vida pela internet’, mas o que vimos nestas grandes fintechs foi uma revolução, que passou por vários departamentos como produtos, distribuição, experiência e precificação”, afirma Forster, resumindo que as seguradoras trabalham por algo novo, usando toda a experiência acumulada em décadas, para criar um novo modelo de oferta.

Tudo é muito rápido

Lançar produtos no mercado de seguros hoje em dia exige o suporte de toda tecnologia possível, porém, e isso é indispensável, as seguradoras não podem abrir mão de recursos modernos que possibilitem produtos sempre inovadores, e isso inclui tecnologias baseadas em nuvem e integradas a soluções de armazenamento de dados fundamentais para a oferta mais ágil, segura e veloz de produtos no mercado. 

“Neste momento, tecnologias em Cloud são a grande vedete. Aplicações Cloud Native, 100% API’s, fazem a grande diferença e são as que possibilitam atingir os desafios que as empresas necessitam e que já estão enfrentando. Neste momento, seguros conectados são uma grande opção e, para poder oferecer esse tipo de ajuda, as empresas precisam estar habilitadas para utilizar essa tecnologia, além de oferecer para seus parceiros e clientes essa facilidade”, resume Weliton Costa.

Para Ricardo Stamato, apesar da “onda de otimismo” com inteligência artificial, a popularização do uso de API’s é o que mais está impulsionando a criação de novos produtos e serviços, abrindo novos canais e agilizando processos,  popularizando e tornando mais prático o acesso ao seguro.

Há novos produtos sendo criados, e isso é bastante evidente para o consumidor de seguros mas, também, vem sendo empregado um, digamos, retrofit aplicado em alguns produtos já existentes no mercado de seguros. Esse movimento parte principalmente das insurtechs. Para Forster, esse contexto pode ser, no entanto, um ponto interessante para a indústria securitária, sobretudo frente a uma nova demanda de consumidores entrantes no mercado. “Mas como novidade mesmo, podemos elencar alguns pontos como: foco de fato na pessoa e não no produto. Esse enfoque comercial e técnico muda toda a estrutura de entrega e operacional das seguradoras, e que as insurtechs estão colocando muita atenção; uma melhor análise da experiência do segurado na hora da contratação do seguro, com esse olhar de focar no cliente; grandes movimentos tecnológicos nas linhas de subscrição, emissão e regulação de sinistros; o digital não é uma novidade, mas a relevância que ele tomou, sim! A oferta de seguros em canais pouco explorados anteriormente trouxe um incremento alto para esse nosso mercado, aumentando a fatia dos que possuem proteção em nosso país e novas formas de se precificar e cobrir nichos específicos, como os seguros paramétricos”, explica o executivo, para quem, em meio a tantas novas operações no setor, há uma que está atrelada ao billing

“Muitos projetos novos dependem de uma cobrança mais leve, mais democrática, que atenda o modelo do canal de uma forma realmente efetiva Destaco a venda de produtos no modelo assinatura que foge da trilha tradicional de apólices anuais. Este modelo de produto puxa diversas frentes de inovação deste mercado, a começar pelo próprio desenho do produto, que ao invés de ser uma apólice tradicional, anual, é desenhada dentro de uma emissão mensal”, enfatiza Forster.

Recentemente nomeado presidente do Clube Vida em Grupo do Rio de Janeiro (CVG-RJ), Edson Calheiros destaca que as novas circulares emitidas pela Susep tornaram a criação de produtos e aprimoramento da distribuição mais fáceis para as seguradoras. “Diminuiu-se muito o seu custo. Antes se gastava muito com papel, uma proposta tinha que ser preenchida várias vezes, hoje está tudo caminhando para digital, muito mais fácil e rápido. Um exemplo é o segmento de veículos, no qual as seguradoras olham com atenção os carros híbridos e já atentam para considerar a cobertura para cabo de carregamento em caso de roubo/furto. Oferecem assistência 24 horas diferenciada com atendimento concierge, entre outras coberturas mais pensadas e exclusivas para este perfil de veículo”, diz Calheiros.

Carteiras e consumidores

Obviamente, com a praticidade e abertura de novos canais, a competição vem aumentando e o consumidor é beneficiado com novos produtos, ofertas, menores custos e produtos mais customizados. Como destaca Ricardo Stamato, o seguro de automóvel é o mais avançado desse cenário recente. “Mas seguros de menor ticket como residenciais, e até mesmo assistências, cada vez mais serão atingidos”, lista o executivo da Confitec.

Heitor Marin não pensa diferente. Ele sinaliza que duas carteiras serão mais impactadas por novas tecnologias e, consequentemente, delas surgirão produtos inovadores: “A tecnologia, de uma forma geral, vai permear todos os produtos de seguros. Mas onde teremos maior notoriedade será nos seguros de danos, de automóvel e residencial, que é onde há uma maior percepção do consumidor de uma forma geral”, menciona o consultor da Peers.  

Para ele, modelos pay per use, ou seja, “pague para utilizá-lo” e “ligue” ou “desligue” o seguro no momento que desejar, serão cada vez mais comuns no setor de seguros. Ele cita como exemplo uma apólice de automóvel pela qual o cliente paga pelo uso condicionado à telemetria. “As evoluções tecnológicas vão nos possibilitar uma maior assertividade naquilo que o consumidor precisa, da necessidade dele. Acredito que nessas carteiras de massificados haverá uma maior percepção do uso da tecnologia. Isso para fora. Para dentro, há a tecnologia de inteligência artificial, de big data, onde se conseguirá concentrar um número de dados gigantesco que antes não se conseguia. Não havia capacidade de processamento para gerar insights de negócios, para gerar uma melhor experiência do cliente com a resolução de sinistros, por exemplo, onde há inteligência artificial analisando documentos, analisando fotografias, analisando dados e auxiliando em todo o processo de backoffice para agilizar esse processo. A tecnologia traz um grande benefício não só para o pré-venda, mas, também, para o pós-venda”, avalia Marin.

O consumidor está em um momento nunca vivido por ele, onde as empresas que querem sobreviver precisam realmente colocar o foco no consumidor, respeitando suas preferências, criando jornadas específicas que facilitem a vida do cliente e que possa proporcionar a autonomia esperado por ele. “Óbvio que não se pode parar por aqui porque estamos em evolução constante e sempre precisaremos estar à frente da concorrência”, pondera Weliton Costa, que acrescenta: “Com a criatividade e a modernização, todas as carteiras ganharam com isso, podendo abusar (sic) dessas inovações para ofertar serviços e produtos nunca comercializados”. Como explica Edson Calheiros, o seguro tem seu conceito ainda bem resistente, dependendo do segmento abordado, principalmente no ramo de pessoas, onde há um maior “tabu” a ser quebrado, porém, diz ele, as estatísticas mostram que vem crescendo a aceitação e a consciência da importância do seguro de vida no dia a dia das pessoas. Já no mercado em geral a adaptação está bem avançada, percebe Calheiros: “A maioria das carteiras de seguro é acompanhada par e passo pela tecnologia. Porém existe um detalhe que está bem evidente: nunca houve tanta preocupação com os dados das pessoas como estamos percebendo hoje. As análises preditivas, que são basicamente a capacidade de processamento dos dados via inteligência artificial e machine learning, permitem que as empresas de seguros coletem dados do cliente para entender e prever seu comportamento. Essa análise também pode identificar riscos de fraude, fazer triagem de sinistros, antecipar tendências e muito mais.”

Dança da precificação

A tecnologia é verdadeiramente a grande aliada para que a precificação dos produtos seja mais precisa e justa, como avalia Weliton Costa, para quem a personalização (aliada ao preço) também será o fator primordial para decisão de compra do consumidor. “Com um produto ajustado às suas reais necessidades, ficará mais fácil o processo de venda”, entende o diretor da eBaoTech.

Com o foco, portanto, no consumidor, cabe à equipe de produtos o redesenho dos atuais e o desenvolvimento de novos, como recomenda Luis Forster: “A turma de precificação precisa acompanhar e, para isso, poderá ter que ir atrás de novas tecnologias e locais para se buscar esses dados, para, enfim, entregar produtos novos, com preços assertivos. Isso tudo traz uma série de novas oportunidades para todos, pois com produtos novos, desenhados e entregues, com a união da tecnologia nova e a já utilizada, acreditamos muito que outras camadas de segurados poderão fazer parte deste ecossistema”, complementa o CEO da PDVBox.

Desafio chamado “API”

A utilização de API’s (application programming interface) ainda é um desafio para o setor de seguros no fomento de acordos que permitam o uso de plataformas abertas. O grande gargalo para a digitalização mais célere da indústria de seguros encontra-se nesse ponto.

“Para mim, este é o ponto principal a ser trabalhado pelas seguradoras para abrir de vez as possibilidades de criação de processos inovadores nas ofertas de seguros para a população”, esclarece Stamato.

Segundo Rogerio Guandalini, não dá para dizer que o setor não esteja  avançando nesse ponto. “Hoje, mais de 80% dos produtos e serviços que oferecemos já está digitalizado com acesso através das API’s, porém o mercado precisa ainda se movimentar de maneira mais célere para que isso se torne uma realidade para todos, facilitando assim as integrações entre as diversas plataformas nas diversas industriais”, frisa.

Heitor Marin pontua que a API é uma tecnologia com cerca de 20 anos e que o principal desafio não se concentra propriamente nela: “Hoje, a API não é o gargalo e, sim, quais as informações que são trafegadas nesse mercado aberto para que se consiga fazer e fomentar uma maior competitividade entre as empresas.”

O que virá por ai?

A todo instante ouve-se no mercado de seguros o anúncio de um novo recurso tecnológico aplicado a novos ou antigos produtos. Para Weliton Costa, a conectividade será o diferencial para oferta de seguros no mercado e grande facilitador entre os consumidores e as empresas de seguros para oferecem seus produtos de maneira mais eficaz. Segundo ele, não haverá um setor específico que será mais ou menos impactado, porque os consumidores estão cada vez mais exigentes. “Se a seguradora não tiver uma ferramenta que facilite a sua compra, o consumidor facilmente poderá desistir de seguir adiante na aquisição do produto ofertado.  No caso dos seguros embutidos (integrados), por exemplo, podemos aproveitar a oportunidade e entrar na jornada do parceiro oferecendo diretamente um seguro associado para qualquer tipo de produto”, afirma.

Heitor Marin sinaliza que, hoje, os maiores investimentos para a evolução de produtos estão concentrados nos seguros massificados de pessoas, PGBL e VGBL. A justificativa para isso — ressalta ele — é o fato de estes seguros registrarem as maiores arrecadações. Ele aposta na expansão dos investimentos de seguradoras em novos produtos de cibersegurança e inclui ainda o seguro rural nesse rol, por conta do valor do risco associado. “São seguros que têm sua indenização paga no mesmo momento do acontecimento do sinistro. Realmente há um avanço que percebo no seguro rural, mas também nos seguros de automóvel e de vida”, assinala Marin, que defende o avanço da telemetria no setor. “É algo que vem para ficar, mas que precisa evoluir. Existem seguradoras, como Porto Seguro e Prudential, que têm alguns produtos relacionados com telemetria, mas ainda de uma forma muito incipiente para realmente entender e mudar o jogo no processo de precificação”.

Há, entretanto, nichos emergentes de mercado que podem ser ainda mais assistidos pela indústria de seguros, sugere Marin. Um deles é o de influenciadores digitais. “Os influencers não são atendidos por nenhum mercado segurador. Qual é o seu maior bem? São os seus seguidores? São suas contas nas redes sociais? Não há ninguém protegendo-os com isso. Esse mundo de redes sociais e de segurança e cibersegurança registrará um impacto bastante bacana no atendimento desses novos produtos”, prevê o consultor da Peers.

E como seria esse modelo de seguro para influenciadores? Marin explica comparando um influencer com um taxista, que tem como liberação da sua receita o carro e seus passageiros. “O do influenciador digital é sua rede de relacionamento, é a sua conta no Instagram, no Facebook ou no Twitter. É ali que ele consegue, através de produção de conteúdos patrocinados e direcionados para alguma marca, gerar a sua receita. Imagine que esse influencer digital tenha sua conta roubada no Instagram. Quem ressarcirá esse influenciador digital? Quem oferecerá segurança a esse influenciador digital para que não perca sua receita igualmente a um taxista que perde tudo após o roubo do seu carro?”, questiona Marin.

Tecnologias decisivas

Inteligência artificial e ChatGPT, apesar da acalorada discussão que os cerca, tornar-se-ão ferramentas decisivas para o setor de seguros a curto prazo. O seguro de criptografia e DeFi (finanças descentralizadas) também constarão da agenda das seguradoras. No segmento de vida e saúde, por exemplo, as seguradoras tradicionais e insurtechs estão usando IA para um atendimento proativo baseado em aplicativos de saúde reforçados em IoT (internet das coisas) e em sensores de nível médico, capacitando os segurados a manter estilos de vida saudáveis. A meta de toda essa investida em novas tecnologias é a redução de sinistros. A inteligência artificial também pode beneficiar as equipes de backoffice, incluindo equipes jurídicas que procuram agilizar análises e identificar riscos em contratos de fornecedores ou litígios de reivindicações. 

Os especialistas acertaram em cheio: os investimentos em tecnologias de automação e análise, como a própria IA, juntamente com seguros conectados (via IoT) vêm aumentando ao longo de 2023 e atingirão o pico no próximo ano, resultando em ofertas de produtos mais personalizados, menor risco e mais eficiência. Mas, afinal, como ficará o corretor em meio a esse cenário com novas tecnologias norteando todas as carteiras de seguros? “Essas ferramentas certamente ajudarão os processos operacionais das seguradoras e corretores, e, como toda inovação tecnológica, estão sendo superestimadas agora, mas seu efeito no longo prazo será permanente”, prevê Ricardo Stamato.

Luis Forster impressiona-se com a velocidade com que as transformações digitais acontecem em um setor que pouco tempo atrás era conservador: “O surgimento de tecnologias e de processos, que se somam ao dia a dia das indústrias como um todo é absurdo. Viemos de uma geração onde as mudanças rápidas aconteciam em anos. Agora, essas mudanças acontecem em segundos”, reflete o executivo, que exemplifica esse contexto ao citar a velocidade com que o ChatGPT vem sendo empregado no setor securitário. “No ano passado, aproximadamente 131 empresas lançaram soluções com essa tecnologia. Agora, somente no último mês (julho) foram 137 as empresas que lançaram inovações com essa tecnologia. Em dois meses mais de 100 milhões de usuários ativos, tornando-se o app de consumo de crescimento mais rápido da história. O ChatGPt é uma ferramenta que pode ajudar muito as empresas na parte de atendimento no primeiro nível, usando os chatbots. Isso pode trazer uma agilidade grande neste primeiro atendimento. Mas um alerta importante que podemos fazer: parametrizar de forma certa esses robôs de atendimento, pois tudo que estiver escrito no wapp ou no local de conversa com o usuário será um documento legal, e já vimos alguns exemplos de conversa, com chats deste tipo em seguradoras, onde as informações recebidas não estavam de acordo com a realidade”, explica Forster.

Ao abordar o impacto da inteligência artificial na cadeia do setor, o executivo aponta alguns exemplos, como a precificação dinâmica, em tempo real, quando, de fato, se entra na subscrição algorítmica e atuarial, com IA, com a finalidade de trazer mais assertividade na precificação e mediação de seguros, criando, posteriormente, novas oportunidades de mercado. “Falar de DeFi é falar de um cenário de produtos construído sem intermediários tradicionais, como bancos e instituições financeiras, permitindo a transação de serviços financeiros diretos entre pares, o famoso P2P (peer to peer). Pensando no mundo dos seguros, podemos fazer a seguinte imagem: uma cooperativa organiza um tipo de proteção, define as regras daquele seguro e colocam uma inteligência para cuidar dos contratos. E toda mediação e pagamento ficam a cargo da cooperativa, sem precisar de uma instituição reguladora para isso. Existem operações similares a essa atualmente, que são as empresas de proteção veicular. Mas sabemos que existem aquelas que não atuam de forma séria, que comprometem toda a cadeia”, alerta Forster, concluindo que o propósito seria criar algo sólido, que, por conta da facilidade de se operacionalizar, somada ao baixo custo operacional e burocrático, poderia trazer redução de custos para a cadeia e um processo de pagamento mais facilitado, tanto na entrada quanto nos sinistros.

“Podemos ir além e pensar em um modelo de blockchain, onde esse produto criado possa ser comercializado mundialmente, quase como uma cooperativa global na internet, transacionando proteção e valores em um ambiente seguro. Podemos pensar também nestas linhas, mas em um ambiente regulamentado (distributed ledger technology (DLT) ou tecnologia de ledger distribuído) onde os processos de opens, feitos por organizações autorizadas, poderão trocar informações dentro do mercado, para se chegar também a produtos e serviços mais assertivos e com custos mais atraentes aos segurados. Um bom exemplo de tudo isso são os seguros paramétricos, onde uma seguradora analisa os riscos pré e futuro, precificam o produto e colocam para ser comercializados, tendo como um dos fatores determinantes de mudança no modelo, na parametrização do sinistro, e é parametrização e não regulação, visto que já foi definido antes as regras do jogo.”

André Felipe de Lima
Revista Apólice

* Esta reportagem foi publicada originalmente na Edição 290 da Revista Apólice

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