A Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde) está processando oito fabricantes multinacionais de dispositivos médicos sob o argumento de que fraudaram o comércio de órteses e próteses no Brasil.
A entidade ingressou com as ações civis em cinco Estados norte-americanos (Nova York, Minnesota, Dallas, Ohio e Delaware) em que pede reparação de danos e indenização às empresas Boston Scientific, Arthrex, Zimmer Biomet Holdings, Abbott, Biotronik, Orthofix, Stryker Corporation e St Jude Medical.
Segundo a denúncia, por meio de suas subsidiárias e distribuidores no Brasil, as empresas pagaram propinas a médicos (de até 30% do valor do produto) e a hospitais, com a intenção de influenciá-los a usar seus dispositivos em detrimento de outros mais baratos ou mais adequados.
As empresas negam as acusações, dizem que estão comprometidas com a ética e que se defenderão nos tribunais.
É a primeira vez que o setor de planos entra com ação coletiva contra fabricantes de próteses.
“Temos provas robustas, dossiês do Brasil todo. São dois anos de investigação e mais de 3.000 documentos”, afirma Pedro Ramos, diretor da Abramge.
Segundo ele, as ações reúnem, por exemplo, notas fiscais de um distribuidor em que o preço de um mesmo produto variou de R$ 100 mil a R$ 300 mil.
Investigação
Conhecida como “máfia das próteses”, a prática é investigada pela Polícia Federal há dois anos. Ao menos 40 pessoas já foram detidas.
A fraude traz prejuízos aos planos e ao SUS, que pagam por produtos superfaturados.
Em alguns casos, cirurgias foram indicadas sem necessidade ou sabotadas para que pacientes fossem reoperados e, com isso, gerassem mais lucros.
Em setembro, 13 pessoas foram presas numa operação da PF no Distrito Federal, entre elas sete médicos.
Em razão das fraudes, a variação de preço de um mesmo produto no país chega a mais de 3.000%, revelou estudo da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) e da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
Ramos afirma que as más práticas, além de aumentar o custo da saúde (e da mensalidade do plano), induzem médicos a fazer procedimentos desnecessários só para obter vantagens das empresas.
“Isso causa dor e sofrimento desnecessários aos pacientes e pode levar até à morte.”
Em uma investigação feita pela PF no DF, suspeita-se que cem pessoas tenham sido vítimas do esquema.
Regulação
Segundo Ramos, o esquema se beneficia de regras regulatórias, como a da ANS que obriga que cirurgias eletivas de grande complexidade sejam feitas em até 21 dias.
“As compras desses produtos [dispositivos médicos] têm de ser feitas a toque de caixa.”
Em nota, a ANS diz que a resolução que trata dos prazos máximos de atendimento foi concebida com o intuito de proteger o consumidor.
“A norma em nada tem a ver com práticas lesivas e comportamento do mercado. As soluções para as distorções devem ser tratadas com a reorganização do modelo assistencial e de remuneração”, afirma a agência reguladora.
Ramos também cita como outros fatores que favorecem as fraudes os múltiplos registros de órteses e próteses na Anvisa e a falta de uma base de preços desses produtos.
Em nota, a Anvisa diz que a legislação vigente não veda os múltiplos registros para um mesmo produto para saúde e que, em termos práticos, ela pouco ocorre, pois requer o pagamento de múltiplas taxas regulatórias por parte das empresas.
Sobre a precificação de produtos para saúde, a agência diz que não há previsão legal para o assunto.
Mas afirma que estão em curso medidas para a reestruturação e a ampliação da transparência do processo de produção, distribuição e utilização dos dispositivos médicos, além da regulação de preços e de acesso desses produtos.
Fonte: Folha de S.Paulo
L.S.
Revista Apólice