EXCLUSIVO – O impacto das mudanças climáticas já é uma realidade no Brasil e tende a se intensificar nas próximas décadas. A avaliação é de Tobias Grimm, Chief Climate Scientist da Munich Re. Em entrevista exclusiva à Revista Apólice, o especialista destacou que o país enfrenta um duplo desafio: lidar com eventos climáticos cada vez mais severos e reduzir a lacuna de proteção, que ainda deixa 90% das perdas sem cobertura de seguro.
De acordo com Grimm, o Brasil segue a tendência global de aumento de temperatura e intensificação dos eventos extremos. “Temos períodos de excesso e de escassez de água cada vez mais frequentes e intensos. As enchentes no Sul são um exemplo claro disso”, afirmou. “Eventos extremos estão se tornando mais prováveis e mais intensos. Nosso papel como resseguradora é entender até que ponto a mudança climática já influencia esses resultados e refletir isso no precificação”, explicou .
Para reduzir o impacto das catástrofes naturais, Grimm defende uma combinação de tecnologia, prevenção e mudança de comportamento. Segundo ele, o avanço dos modelos climáticos e das soluções paramétricas permite mapear riscos com mais precisão, mas o comportamento humano continua sendo decisivo. “Muitas pessoas ainda são pegas de surpresa. Após cada desastre ouvimos que foi um evento sem precedentes. No entanto, precisamos de mais consciência sobre os riscos pessoais e de políticas públicas que incentivem a ocupação de áreas menos vulneráveis”, ponderou Grimm.
Ele reforça a importância de sistemas de alerta antecipado e educação em risco climático, especialmente para populações mais vulneráveis. Grimm ressaltou que o setor segurador tem papel fundamental na transição para uma economia de baixo carbono. A Munich Re, segundo ele, já atua fortemente na cobertura de projetos de energia limpa, como parques eólicos, solares e de hidrogênio. “Oferecemos soluções para tornar essas tecnologias mais acessíveis. Por exemplo, cobrimos a perda de desempenho de uma planta solar, garantindo que os financiadores tenham segurança mesmo em caso de falha do fabricante”, explicou. Essa abordagem, diz o executivo, é essencial para acelerar o desenvolvimento de infraestruturas sustentáveis.
A Munich Re oferece um produto de crédito de carbono para dois regimes regulamentados de crédito de carbono (Califórnia e Alberta), no qual ofer4ece seguro contra invalidação/cancelamento que indeniza os proprietários de créditos de carbono (compensação) contra o cancelamento ou invalidação desses créditos.
O cenário futuro, segundo Grimm, exige preparo e adaptação. “As emissões continuam crescendo e 2024 foi o ano com o maior volume já registrado. Já ultrapassamos o limite de 1,5°C em um ano, o que indica que o aquecimento global deve seguir entre 2°C e 3°C nas próximas décadas”, avaliou. Nesse contexto, o executivo destaca que a resiliência e a adaptação serão cruciais: “Precisamos equipar nossos clientes para um mundo mais quente, incentivando medidas preventivas e soluções de mitigação” .
Reduzir a lacuna de proteção
Um dos temas mais preocupantes, segundo Grimm, é a baixa penetração do seguro no Brasil. “Cerca de 90% das perdas por desastres ainda não estão cobertas. Globalmente, essa média é de 60%. É uma lacuna enorme que precisa ser reduzida”, alertou.
Ele cita como exemplo o modelo Flood Re, implementado no Reino Unido, que uniu governo, seguradoras e consumidores para tornar todos os riscos de inundação seguráveis e reinvestir parte dos lucros em medidas de prevenção. “Esse tipo de cooperação público-privada pode inspirar soluções locais. Cada país precisa adaptar o modelo à sua realidade”, exemplificou.
Grimm encerrou a entrevista com um apelo à mudança de mentalidade sobre o seguro. “Muitas pessoas o encaram como um gasto e se decepcionam se não têm sinistros. Mas o seguro deve ser visto como um investimento em gestão de risco, essencial para a sustentabilidade das empresas e para o desenvolvimento econômico”, concluiu.
Kelly Lubiato




