O mercado global de resseguros passou por uma profunda transformação nas últimas três décadas, moldado por mudanças econômicas, tecnológicas, regulatórias e ambientais. De um setor tradicionalmente concentrado e conservador, o resseguro evoluiu para se tornar uma peça fundamental na engrenagem da gestão de riscos complexos que caracterizam o século XXI.
Nos anos 1990, o mercado de resseguros era dominado por grandes companhias europeias e americanas, muitas vezes com forte ligação a grupos seguradores. Desde então, houve uma significativa consolidação do setor, por meio de fusões e aquisições, com o objetivo de ampliar a capacidade financeira, otimizar estruturas operacionais e enfrentar os crescentes desafios da volatilidade dos riscos. Ao mesmo tempo, o mercado se tornou mais globalizado, com resseguradoras de origem asiática e do Oriente Médio ganhando relevância, e o surgimento de hubs de resseguro em mercados emergentes.
As últimas três décadas testemunharam o aumento da complexidade e diversidade dos riscos. Eventos catastróficos, como os ataques de 11 de setembro, o furacão Katrina (2005), o terremoto e tsunami de Tohoku (2011) e, mais recentemente, os impactos das mudanças climáticas e da pandemia de Covid-19, impuseram novos desafios ao setor.
Outro vetor importante foi a inovação nos instrumentos financeiros. O crescimento dos Insurance-Linked Securities (ILS), as Letras de Riscos de Seguros (LRS), como os cat bonds, permitiu que investidores institucionais acessassem o mercado de risco segurador, ampliando a capacidade do setor. Essas inovações contribuíram para maior liquidez, pulverização de riscos e diversificação de fontes de capital. Ao mesmo tempo, a tecnologia transformou o modelo operacional das resseguradoras, com o uso crescente de inteligência artificial, modelagem preditiva, big data e automação, permitindo uma precificação mais precisa e uma melhor compreensão dos riscos.
A evolução regulatória também foi marcante. O marco de Solvência II na Europa, as reformas no sistema de solvência norte-americano e os avanços em normas contábeis internacionais, como o IFRS 17, promoveram maior transparência, padronização e robustez financeira ao setor. A governança corporativa ganhou protagonismo, e o compliance tornou-se uma exigência fundamental. Os resseguradores passaram a adotar modelos de gestão de risco mais robustos e estratégias de capital mais conservadoras.
Nos últimos anos, a pauta da sustentabilidade e da resiliência tornou-se central. O resseguro tem papel crucial na proteção da sociedade diante de eventos extremos, e sua atuação vai além da compensação financeira: ele influencia práticas de gestão de risco, promove prevenção e incentiva políticas públicas. Em um mundo cada vez mais exposto a eventos climáticos severos, o setor tem se posicionado como parceiro estratégico para a adaptação e mitigação desses riscos.
Olhando para frente, o resseguro tende a se tornar ainda mais estratégico. A digitalização, os riscos emergentes e a demanda por soluções customizadas exigem flexibilidade, capacidade analítica e inovação constante. Ao mesmo tempo, a colaboração entre resseguradores, seguradoras, governos e instituições multilaterais será essencial para ampliar o acesso à proteção financeira em regiões subatendidas.
O mercado de resseguros não apenas acompanhou as transformações do mundo — ele foi protagonista em muitas delas. Nos próximos anos, sua relevância continuará crescendo, consolidando-se como um pilar fundamental da segurança econômica global.
E como eu sempre digo, não há uma economia forte sem a figura do seguro e o resseguro atrelado a ela.
Eduardo Toledo, Presidente da ABECOR
*Artigo originalmente publicada na Revista Apólice #311.