Ultima atualização 05 de fevereiro

Como consolidar (ainda mais) o uso do seguro de crédito no Brasil

Apesar do crescimento do produto em 2023, sua utilização no Brasil ainda é restrita se comparada com países da Europa e os Estados Unidos

De acordo com a CNseg (Confederação Nacional das Seguradoras), o primeiro quadrimestre de 2023 registrou crescimento acelerado na utilização do seguro de crédito. Em relação ao mesmo período de 2022, houve aumento em 24,3% na demanda, com mais de R$ 740 milhões arrecadados, e aumento de 411,9% nas indenizações pagas.

Apesar do reconhecido crescimento deste setor em 2023, sua utilização ainda é restrita se comparada a outros países, como países europeus e Estados Unidos da América.

O seguro de crédito, resumidamente, é aquele contratado pelo fornecedor em face de potencial inadimplência financeira de seus compradores. Evidenciada a inadimplência, a seguradora indenizará o fornecedor, em parte da dívida inadimplida. 

Adriana Hellering Spiewak,

O seguro de crédito, ao reduzir o risco da insolvência, torna-se bastante vantajoso para todas as partes envolvidas, já que os fornecedores, ao protegerem seu fluxo de caixa, naturalmente, tendem a conceder condições comerciais mais favoráveis, beneficiando, assim, os compradores. Obviamente que o mercado brasileiro acaba se beneficiando, já que há um maior engajamento comercial, o que beneficia a economia do país, especialmente, diante da crise de crédito atual, em muito, resultante do evento Americanas).

Compreendida a atuação essencial da seguradora de crédito nas relações comerciais, fica clara a sua, ainda mais relevante, participação em um cenário de distressed (quando determinado comprador, por exemplo, ingressa em recuperação judicial).

Evidentemente que, num cenário de recuperação judicial, a primeira reação do mercado e, dos fornecedores é imediatamente cessar novas vendas, já que não há garantia de soerguimento da atividade de seu comprador, não sendo natural o aumento da exposição financeira. Esta insegurança, entretanto, pode ser reduzida quando, na relação comercial, há cobertura por seguro de crédito.

Como, então, tornar o seguro de crédito mais acessível e consolidar ainda mais a sua utilização? Um dos caminhos pode ser a disponibilização de instrumentos jurídicos que aumentem as chances de as seguradoras de crédito recuperarem seu crédito, barateando, com isto, o custo de sua contratação, pois, quanto menor o risco de não recuperação do crédito pela seguradora menor será o prêmio cobrado do segurado, o que, em última instância, poderia contribuir com a disseminação deste seguro.

Uma possibilidade que asseguraria maior recuperabilidade do crédito seria estabelecer no Plano de Recuperação Judicial condições privilegiadas de pagamento não apenas para fornecedores colaboradores, como também para seguradoras de crédito, em troca, não apenas da manutenção do fornecimento pelo fornecedor segurado, mas também, da manutenção da cobertura do seguro de crédito em relação à tal operação.

Do lado da seguradora, apesar de as Apólices, normalmente, preverem a exclusão de cobertura para empresas em recuperação, se a recuperação do crédito for célere e integral, é possível que, excepcionalmente, se mantenha a cobertura sobre novas vendas, o que, obviamente, resulta num interesse maior do fornecedor em manter a relação comercial com a empresa em recuperação judicial.

Essa, portanto, é uma situação vantajosa para todas as partes envolvidas, pois (i) a seguradora garante a recuperação da indenização paga, de forma privilegiada; (ii) o fornecedor passa a ter cobertura de seguro para as novas vendas, reduzindo exposição financeira e; (iii) as empresas em recuperação judicial, com a continuidade do fornecimento, aumentam as chances de preservação de sua atividade e efetiva recuperação.

Do ponto de vista jurídico, apesar de a jurisprudência já ser, há tempos, pacífica sobre o tema, a reforma à Lei 11.101/05 estabeleceu objetivamente a possibilidade de o Plano de Recuperação Judicial prever “tratamento diferenciado […] a fornecedores de bens ou serviços que continuarem a provê-los após o pedido de recuperação judicial, desde que tais bens ou serviços sejam necessários para a manutenção das atividades […]”. De modo que, nada impediria a previsão de condições especiais de pagamento aos fornecedores e seguradoras.

Há, ainda, outro argumento jurídico que ratifica a possibilidade de as seguradoras serem agraciadas com condições diferenciadas de pagamento: ao efetuarem o pagamento da indenização aos fornecedores, se sub-rogam nos seus direitos, e, por expresso dispositivo do Código Civil, a sub-rogação transfere ao credor as mesmas condições, privilégios e garantias do crédito original.

Se o segurado é fornecedor colaborador, por força da sub-rogação, as seguradoras de crédito também serão, o que lhes autorizará receber seu crédito sujeito à recuperação judicial nas mesmas condições diferenciadas de pagamento do fornecedor segurado que mantiver o fornecimento (credor colaborador).

Por fim, a nova redação do artigo 83, §5º, da Lei 11.101/05, previu que “para os fins do disposto nesta Lei, os créditos cedidos a qualquer título manterão sua natureza e classificação”. Em que pese a origem do dispositivo ser aplicável em casos de falência, nada impede a sua utilização em cenário de recuperação judicial. 

Se assim o é, se o fornecedor segurado for considerado credor colaborador, certamente, ao ter parte de seu crédito sub-rogado pela seguradora, transferirá tal posição, conforme expresso dispositivo legal.

Portanto, nada impede que as seguradoras de crédito sejam consideradas credoras colaboradoras e, portanto, possam ser agraciadas com condições diferenciadas de pagamento pela empresa em recuperação judicial. 

Na verdade, sobram argumentos para fundamentar a classificação das seguradoras como credoras colaboradoras. Dispositivos normativos, racional mercadológico e preservação da atividade econômica são componentes desta fundamentação, que poderá consolidar a oferta do seguro de crédito no país e, consequentemente, ajudar a reduzir o risco de crédito atual.

* Por Adriana Hellering Spiewak, sócia fundadora do escritório HSA LAW

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