Ultima atualização 17 de fevereiro

Corretor contesta Susep e diz que não encarece o mercado

Gustavo Cunha Mello, sócio da Correcta Seguros, explica que o que encarece o seguro não é o corretor, mas a alta sinistralidade do mercado
Gustavo Cunha Mello
Gustavo Cunha Mello

Revista Apólice: Qual é o nível de comissionamento médio dos corretores de seguros?

Gustavo Cunha Mello: A comissão varia conforme o ramo de seguro, os seguros com prêmios muito baixos e que requerem um esforço grande para a venda – pois não encontram interesse do consumidor – costumam ter um percentual maior, que raramente ultrapassa a 25% ou 30%. Os que vendem mais facilmente tem um percentual menor. O seguro mais vendido, de automóvel, tem uma comissão média de 15%. É fundamental lembrar que essa comissão trata-se do faturamento bruto da corretora, que desse valor pagará tributos, salários e encargos de seus colaboradores, os custos do seu escritório, prestará serviço por 12 meses, e viverá com aquilo que lhe sobrar. E ainda que o corretor não recebe salário fixo, férias remuneradas, 13º salário etc. Ou seja, só recebe o que ganha de sua venda.

Revista Apólice: Quanto da distribuição no Brasil é feita de forma direta?

Gustavo Cunha Mello: Em todos os países com mercados de seguros avançados, em especial na Inglaterra, nos EUA, no Canadá, entre outros, 80% da venda é feita através de corretores. Apenas 20% é feita por outros canais de distribuição: bancos, telemarketing etc.

Revista Apólice: É possível comparar esta distribuição com outros países?

Gustavo Cunha Mello: Sim. Nos EUA, por exemplo, o corretor ganha em média 20% de comissão nos seguros de veículos. Lá a sinistralidade é bem menor, o que dá menos trabalho ao corretor; a frota é bem maior, o que ajuda a vender muito mais facilmente, e ainda não tem custos trabalhistas nem os impostos que os corretores brasileiros amargam. Aqui, nós ganhamos menos, 15% em média no seguro de automóvel, para trabalhar muito mais. Algumas pessoas vem dizendo o contrário, que o corretor brasileiro ganha muito e é o responsável pelo preço elevado do seguro. Isso é uma grande mentira, o seguro brasileiro é mais caro em função de uma sinistralidade mais elevada só isso.

Revista Apólice: O custo da distribuição direta é mais baixo para as seguradoras?

Gustavo Cunha Mello: Não! O corretor é muito mais barato! Às seguradoras não interessa destruir o canal de distribuição dos corretores. Além de ser o canal mais motivado, pois só recebe aquilo que produz. Se não produzir nada ganha. É o canal mais barato que existe, não recebe salário e encargos como a venda direta através de bancos e telemarketing, não tem custo elevado de manutenção como sistemas de TI e aplicativos. Inclusive na Inglaterra e nos EUA, a experiência mostrou que os canais de aplicativos e sites de venda direta são responsáveis por 90% das fraudes que houveram.

Revista Apólice: Quais são os riscos da distribuição direta?

Gustavo Cunha Mello: Principalmente uma baixa produtividade e a fraude quando o cliente vem pela internet ou de aplicativos. Outra questão: se acabarem com a profissão do corretor de seguros, hoje um autônomo com regramento próprio, no futuro os “vendedores de seguros” terão direitos trabalhistas frente às seguradoras que os usarem por mais de 3 meses. Ou seja, isso não interessa às seguradoras. Sairá bem mais caro.

Revista Apólice: Por que nenhuma empresa de distribuição direta conseguiu se firmar no Brasil?

Gustavo Cunha Mello: Simplesmente ainda não existiu a venda direta. Alguns sites que foram abertos já fecharam. Há uma seguradora estatal que tentou lançar um aplicativo, investiu muito dinheiro em campanhas e no seu aplicativo. O tempo passou, e o que seria uma ameaça aos corretores, hoje é motivo de piada. As ações na bolsa de valores dessa empresa deram prejuízo. Esqueceram que a venda de seguros requer uma relação de confiança e empatia.

Revista Apólice: Há espaço para a convivência entre a distribuição direta e os corretores de seguros?

Gustavo Cunha Mello: Não há nenhuma obrigação de se fazer seguros através de um corretor. Não é obrigatório. Isso é outra grande mentira repetida por aí. As pessoas podem fazer direto na seguradora e até através de bancos. Ocorre que muitas seguradoras não tem esse interesse, pois sai mais barato utilizar o canal dos corretores.

Revista Apólice: Você acredita que há poucas seguradoras operando no Brasil?

Gustavo Cunha Mello: O corretor de seguros não é o problema da concorrência. São 60 mil corretores em todo o país. Nenhum corretor consegue elevar o custo, pois o cliente consulta outro corretor com muita facilidade até pela internet.

Já as seguradoras têm uma grande restrição: cerca de 18 companhias atuam no ramo de automóveis, apenas 12 fazem 95% dos seguros de riscos nomeados e operacionais; 9 companhias concentram 95% dos prêmios de seguros de RC ambiental, 12 seguradoras concentram 95% do seguro de D&O. Isso apenas para citar alguns exemplos. No mercado de resseguros a concentração é ainda pior. Essa concentração é natural de todos os mercados de seguros no planeta. Se o governo deseja melhorar a concorrência deve atuar onde há concentração e não onde temos 60 mil competidores. E aumentar a concorrência de seguradoras e resseguradoras passa por facilitar o ingresso de novas empresas, o investimento maior das seguradoras já existentes, estímulos com menos burocracia, menos impostos etc.

Revista Apólice: O custo da distribuição é um fator impeditivo para a entrada de novos players no mercado?

Gustavo Cunha Mello: Não. A venda por aplicativos não é impactada pela existência ou não de corretores. Além de não ser obrigatório o uso de uma corretora, é muito fácil e simples abrir uma nova corretora caso os investidores desse aplicativo entendam que será um caminho mais simples que convencer uma seguradora a aceitá-lo como canal de distribuição.

Revista Apólice: As seguradoras de “baixo custo” irão distribuir seus produtos diretamente?

Gustavo Cunha Mello: Isso eu quero ver. Para mim, seguro é um mercado a parte. Não é companhia aérea e nem restaurante a quilo. Virou moda quererem inventar nomes e aplicativos sugerindo que alguns gênios iluminados trouxeram uma nova forma de
vender seguros. Existe um site chamado “startup graveyard” cheio de novidades falecidas.Não existe mágica e nem almoço grátis. O sinistro vem e a conta chega. Ou tem solidez e capacidade de pagamento ou vai vender bananas.

Cabe à Susep defender o consumidor somente, ela não pode defender investidores de aplicativos, cabe a ela proteger o segurado de empresas que não terão como indenizá-los. Já sofremos muito no mercado com GNPP, Ajax, Carioca, Banerj, Castelo Costa, Monarca etc. Deixaram muita gente na mão e sem receber. Agora vem uma nova onda de inovadores. Sem solvência e sem reserva técnica não desce para o play, vai se machucar e machucar outros. Gestões anteriores da Susep cuidaram bem disso e deixaram um mercado sólido e forte, herdado agora por essa nova gestão.

Revista Apólice: Empresas que comercializam produtos “peer to peer” tendem a ter sucesso no Brasil?

Gustavo Cunha Mello: Grandes empresas fazem licitações e compram direto de muitas seguradoras. Não tem corretor. Eventualmente contratam um corretor como consultor, pagando um fee por contrato. Isso já existe, De novo, é mentira dizer que o corretor é obrigatório.

Revista Apólice: Quais são as oportunidades de emprego que surgem com a nova regulamentação para corretores?

Gustavo Cunha Mello: Isso é outra besteira. Aplicativo não gera emprego, só de TI.
Os corretores que são 60 mil em todos país, empregam em média 5 pessoas. São 300 mil empregos diretos. Deputados, Senadores e Presidente precisam perceber que nesse grupo tem muito voto a ser conquistado ou perdido. Atacar o corretor não tem como gerar emprego, só destruir.  Não é bom para o segurador que pagará mais caro em outras distribuições, também não é bom para o consumidor que perderá a quem recorrer como apoio na hora que mais precisar para usar o seguro.

Revista Apólice: Algo mais a dizer?

Gustavo Cunha Mello: É mentira dizer que o corretor ganha muito e encarece o seguro. A seguradora vende seu produto apenas, o corretor é a engrenagem do mercado para estimular a concorrência desse mercado já concentrado, pois ele sim mostra várias opções de seguradoras ao cliente final. O corretor estimula a competição e assim ajuda a reduzir o custo. Só quem nunca trabalhou com seguros ou nunca abriu um livro técnico de seguros, ou nunca pesquisou os mercados de seguros mais avançados do mundo, para poder imaginar o contrário.

Kelly Lubiato
Revista Apólice

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