A pandemia do coronavírus mostrou como o mercado, em diversos segmentos, não estava preparado para situações que saem da curva da normalidade nos nossos dias.
Em meio a tanta tristeza e incerteza, estamos vendo o setor privado se reinventar e buscar novas saídas para tornar esse período um pouco mais tranquilo aos brasileiros.
Dentre muitos mercados que estão com os holofotes da mídia voltados para si, o mercado de seguros vem se sobressaindo desde o início da crise e ganhou ainda mais notoriedade na última semana.
Muitas medidas se destacaram durante esse período. Desde o princípio da pandemia, a maioria das seguradoras adotou o posicionamento de cobrir os casos de morte por covid-19, apesar de haver cláusula contratual excluindo a obrigação dessa indenização.
Entretanto, apesar dessa liberalidade, muitas dúvidas foram surgindo sobre o assunto e o Estado se viu necessitado de intervir e começar a regular a situação.
A Constituição Federal dispõe em seu artigo 22 que a União possui competência privativa para legislar sobre seguros e, historicamente, temos precedentes de Leis que dispunham acerca da matéria, as quais foram declaradas inconstitucionais pelo STF devido à referida competência.
Dito isso, no dia 20.05.2020, o Senado Federal votou o Projeto de Lei no 2.113/2020, que determina que os seguros de Assistência Médica ou Hospitalar, Vida ou Invalidez Permanente não poderão restringir a cobertura a qualquer doença ou lesão decorrente da emergência de saúde pública de que trata a Lei.
O projeto aprovado é um substituto do Projeto de Lei no 890/2020 que recebeu 10 emendas e que, através de um acordo entre o autor (senador Randolfe Rodrigues, Rede-AP) e a relatora do Projeto (senadora Leila Barros, PSB-DF), acabou sendo modificado para o texto aprovado por unanimidade, com 77 votos, pelo Senado Federal e agora segue os trâmites do Poder Legislativo com destino à Câmara dos Deputados.
O texto aprovado trouxe diversas novidades. Além da cobertura dos óbitos decorrentes do coronavírus, o mesmo prevê que as operadoras estão impedidas de suspender ou cancelar contratos por falta de pagamento durante a pandemia, bem como de restringir coberturas durante essa temporada.
O Projeto ainda dispõe que o pagamento da indenização em casos de morte e invalidez permanente deverá ser realizado em até 10 dias corridos, a contar do protocolo de entrega da documentação comprovatória para a seguradora.
Outra parte do texto que merece destaque é o fato de que os segurados poderão optar ou não pela inclusão do risco pandêmico em suas coberturas.
A parte mais polêmica do Projeto diz respeito ao cancelamento do contrato pela falta de pagamento, visto que a aprovação do projeto com o texto atual pode ocasionar um desequilíbrio econômico financeiro para as seguradoras, impedindo-as de arcar com os pagamentos das indenizações, posto que um número elevado de inadimplência poderá impactar no orçamento das empresas. Entretanto, outros senadores destacaram a possibilidade de o segurado renegociar as parcelas em aberto após o fim do período de calamidade.
Apesar da primeira aprovação, o Projeto ainda seguirá sua tramitação normal para a votação pela Câmara dos Deputados, onde poderemos obter uma resposta mais definitiva sobre as chances do mesmo se tornar uma Lei.
As seguradoras ainda não se manifestaram sobre a proposta legislativa, não estando a princípio a favor ou contra a aprovação. Todavia, como as mesmas já haviam se consternado com a trágica situação atual pandêmica e se comprometido com o pagamento, a obrigatoriedade das indenizações está em acordo com a posição por elas tomadas.
Outro ponto que devemos acompanhar de perto é o debate que nascerá a respeito das outras coberturas dos seguros de vida. Atualmente esse produto possui uma vasta linha de opções, além de morte e invalidez permanente, em seu registro na Susep, que não foram mencionadas no projeto de lei e nem abarcadas na declaração das seguradoras a respeito das coberturas indenizáveis durante a pandemia.
Apesar dessa primeira resposta positiva do legislativo, os segurados ainda devem seguir se apoiando na exclusão da cláusula por mera liberalidade das empresas, haja vista que o texto ainda se trata de um Projeto.
Ainda há muitas dúvidas pairando no mercado segurador e quais serão os impactos da pandemia sobre ele, mas uma coisa podemos ter certeza: o poder público e o setor privado estão, cada um da sua forma, buscando amparar os segurados para que a crise cause o menor impacto possível aos contratantes.
* Por Karina Matz, advogada do Miranda Lima Advogados