EXCLUSIVO – Ao contratar um seguro, o que o cliente final espera em troca? Durante muito tempo, a resposta se restringia a um modelo reativo: proteção financeira diante de um imprevisto, sendo um acidente, uma doença ou um sinistro. Porém observa-se que essa lógica está mudando. Pressionadas por um consumidor mais exigente e menos fiel a marcas, seguradoras têm buscado novas formas de engajamento contínuo, com propostas que vão além da cobertura tradicional. Nesse contexto, os Serviços de Valor Agregado (SVAs) ganharam protagonismo como estratégia de fidelização — e também de diferenciação em um mercado onde o preço já não é o único fator de decisão.
Segundo uma pesquisa global da Accenture, 80% dos consumidores esperam que as empresas ofereçam serviços complementares ao produto principal. Já um estudo da McKinsey aponta que três em cada quatro seguradoras no mundo já utilizam ou estão implementando SVAs como parte de suas estratégias de relacionamento com o cliente. No Brasil, esse movimento tem ganhado força com iniciativas focadas em saúde, bem-estar e prevenção, muitas delas conectadas a um público mais jovem e digitalizado.
Uma das empresas que têm surfado nessa onda é a Namu, plataforma de bem-estar corporativo que se tornou fornecedora de serviços para seguradoras e operadoras de saúde. A companhia, que já impacta 1,4 milhão de vidas e projeta chegar a 3,2 milhões até o final de 2025, oferece soluções como check-ups de saúde digital, orientação remota em 11 frentes de bem-estar e acesso a academias com pagamento por uso. “A lógica do seguro tradicional exige que o cliente passe por um problema para usar o serviço. Já os SVAs permitem que ele interaja com a marca de forma contínua e positiva”, explica Deuk Soo Yeo, CEO da Namu. “Essa mudança no modelo de relacionamento reforça o vínculo entre empresa e consumidor, o que aumenta a retenção e reduz a sensibilidade ao preço na hora da renovação”, complementa.
A mudança de perfil do consumidor tem sido um dos principais catalisadores dessa transformação. Com maior acesso à informação e experiência digital, as gerações mais jovens demandam jornadas mais completas, com foco em conveniência, personalização e custo-benefício. De acordo com Deuk, os millennials (nascidas entre aproximadamente 1981 e 1996) já estão influenciando o comportamento de outras faixas etárias, inclusive na forma como se relacionam com produtos financeiros e de saúde. “Essa geração cresceu experimentando serviços sob demanda, pagamentos flexíveis e plataformas intuitivas. Por isso, ela espera que qualquer empresa entregue mais do que o básico. No caso do seguro, isso significa entregar valor mesmo quando o cliente não está em situação de risco”, analisa.
Como exemplo de cases, a Namu estruturou seu portfólio de soluções para atender justamente a essa lógica de uso frequente. Entre elas, Deuk compartilha alguns desses serviços oferecidos, o VitalScan que permite a medição de sinais vitais como pressão arterial, batimentos cardíacos e nível de estresse em tempo real, usando apenas a câmera do celular. Já o Namu Orienta conecta o usuário a profissionais de nutrição, enfermagem, psicologia, saúde da mulher, assistência financeira e até orientação pet, com agendamento rápido e custo acessível. O Namu Pass, por sua vez, permite o acesso flexível a academias, aulas de yoga e pilates, com pagamento por diária — uma alternativa para quem evita planos mensais fixos.
“O objetivo é estar presente na rotina das pessoas com soluções práticas e integradas. Quanto mais o cliente usa, mais ele percebe valor na marca que está por trás daquela experiência”, resume Deuk.
Além de fortalecer o vínculo com o cliente, os SVAs também podem gerar ganhos concretos para as seguradoras. No caso das operadoras de saúde, por exemplo, soluções voltadas à prevenção e bem-estar contribuem diretamente para a redução da sinistralidade, um dos principais indicadores de custo do setor. “O incentivo à adoção de hábitos saudáveis tem impacto direto na frequência e na gravidade de sinistros. A lógica é simples: prevenir sai mais barato do que remediar”, afirma Deuk.
Essa lógica também pode se aplicar a seguros de vida e até ao ramo automotivo, com iniciativas de SVAs voltadas à saúde mental, orientação financeira e bem-estar do motorista. No entanto, para que essas soluções sejam efetivas, é preciso garantir adesão por parte dos usuários. E esse continua sendo um dos maiores desafios do setor.
Segundo o Deuk, o engajamento depende diretamente do esforço de comunicação das seguradoras com sua base de clientes. “Nossos dados mostram que carteiras com boa estratégia de divulgação chegam a ter um índice de usuários ativos mensais (MAU) acima de 30%. É um número alto para serviços de bem-estar, mas que só acontece quando há comunicação frequente e clara sobre os benefícios.”
Outro obstáculo para a expansão dos SVAs é a integração tecnológica com os sistemas das seguradoras. Embora soluções como a da Namu possam ser acessadas de forma independente, uma experiência mais fluida ainda exige conexão com aplicativos, plataformas e bases de dados das companhias parceiras. “É importante investir e foco em criar uma arquitetura flexível, mas sabemos que o ideal é caminhar para integrações mais profundas. Isso ainda depende do nível de maturidade digital de cada seguradora e, em alguns casos, também da regulação vigente”, pontua o executivo.
Apesar desses desafios, o otimismo com o futuro é evidente. Para os próximos anos, a Namu pretende consolidar sua posição no mercado local, especialmente no segmento de seguros massificados, antes de iniciar uma expansão internacional prevista para 2027.
A aposta em SVAs revela uma mudança mais ampla na forma como o setor de seguros se posiciona diante da sociedade. De reativo a proativo, de transacional a relacional, o seguro caminha para se tornar parte da rotina e não apenas uma salvaguarda em momentos críticos.
“A relação do consumidor com o seguro será cada vez mais focada no cuidado personalizado, no dia a dia, e não apenas em eventos extremos”, projeta Deuk. “Estamos entrando na era da hiperpersonalização. O cliente quer ser chamado pelo nome, receber ofertas que façam sentido para sua vida e perceber que a empresa realmente o conhece. Esse será o diferencial nos próximos cinco anos.”
Se o futuro do seguro passa por mais tecnologia, mais personalização e mais relacionamento, os SVAs podem ser o elo que faltava para conectar empresas e consumidores em uma jornada contínua de valor — e no caso do setor de seguros, muito além da apólice.
Nicholas Godoy, de São Paulo