Há pouco mais de 30 anos, se alguém perguntasse para que servia a internet seria difícil para quem não era expert no assunto responder. Com o passar dos anos, o mundo não só se acostumou com a troca de dados e informações como passou a uma relação que beira a dependência. E o que é blockchain, alguém saberia, hoje, responder? Quem faz essa provocação é Paschoal Baptista, sócio-líder de TI para Serviços Financeiros da Deloitte, que garante ainda que a tecnologia blockchain é a segunda fase da internet. “O blockchain veio para fazer a internet de valores. Ela vai viabilizar a mesma coisa que se fazia antes as transferências, porém, nesse caso, de ativos”, explica.
Assim como um livro-razão de contabilidade, o blockchain é um sistema capaz de unificar todas as transações feitas pelos membros de um mesmo negócio, garantir que as liquidações sejam feitas de forma objetiva e mitigando os riscos de fraude e diminuir processos de disputa em relação ao reconhecimento da transação.
Os recentes ataques cibernéticos – WannaCry e Petya – levantaram uma questão: como confiar em um sistema que irá armazenar dados preciosos, ainda mais os médicos? Os executivos utilizam uma só rede, integrada, feita em uma rede privada da qual só os envolvidos têm acesso, facilitando a transparência nos acordos firmados. Caso algum deles sofra qualquer tipo de perda ou ataque de hacker, todo o conteúdo estará protegido, pois já estará compartilhado. Essa utilização está muito mais presente no mercado financeiro, mas já vem despertando o interesse do seguro. O mercado de saúde, dentro das operações de seguros, pode ser o melhor exemplo: clínicas, hospitais, médicos, laboratórios podem ter uma rede única de atendimento e prestação de serviços, onde armazena dados dos pacientes, podendo até mesmo auferir quais atendimentos foram prestados. “Certamente nós vamos ver uma redução de fraudes nesse cenário e isso é desejável a todos que estão no processo. Existe um caminho que certamente vai acontecer”, aposta Luiz Jeronymo, líder de blockchain da IBM Brasil.
Uso prático
A aplicação no mercado de seguros pode ser feita por conta dos processos de sinistros – do aviso ao pagamento; seguro paramétrico – utilizando uma base de dados com fontes confiáveis do tema do referido seguro, o sistema busca essas informações e faz por si só a análise da viabilidade ou não do pagamento da apólice. “Portanto, o mecanismo poderia criar regras de negócios que possam ser executadas automaticamente, armazená-las de forma que os seguros paramétricos pudessem ser executados quase instantaneamente”, explica Jeronymo. As resseguradoras também se beneficiariam, já que muitas vezes precisam interagir para que uma apólice seja negociada ou compartilhada e o contrato se estabeleça. O processo é globalizado, busca atender diferentes legislações e em tempo real. Esses são os chamados smartcontracts. “Também pode ser usada em atrasos de voo. Se um passageiro fez check-in e o sistema identifica que esse voo ainda não saiu, mas já se passou o tempo estabelecido de espera, ele já sabe, automaticamente, que há direito à indenização”, exemplifica Baptista.
“O mercado de seguros está mais aberto do que nunca”, acredita Elias Zoghbi, sócio-líder da área de Seguros da Deloitte. Inovações em modelos, utilização de internet das coisas, otimização de precificação e análise de risco, entre tantos outros fatores são o caminho para uma mudança efetiva no jeito de fazer negócios. “Esse é um conceito que muda a característica de como são os produtos de seguros atuais versus o que teremos no futuro. Assim como os carros autônomos estão mudando os riscos do seguro auto”, pontua Zoghbi.
Apesar das simpatia do mercado e do empenho, Zoghbi acredita que a personalização é que pode fazer a diferença nesse cenário. “A função do corretor [na conscientização] é muito importante, especialmente para manter no mercado as pessoas que não conhecem o seguro. Mas muitos dos que não têm apólices hoje teriam se isso fosse customizado. Quase não temos seguro até para automóvel, como podemos falar de vida e previdência, que tipo de produto a gente vai atender? Os produtos customizados são muito positivos lá fora, aconselha Elias Zoghbi.
Amanda Cruz
Revista Apólice
* Matéria originalmente publicada na edição 223 (julho/2017)