O reaquecimento do mercado de saúde suplementar levou a um novo recorde de beneficiários. Segundo o Relatório de Números do Setor – mensalmente feito pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o número de beneficiários com assistência da saúde suplementar chegou a 51,4 milhões em setembro, com um acréscimo de 1,57% em relação ao mesmo período de 2024.
Os planos chamados “coletivos empresariais” foram os contratos que mais ganharam novos clientes, totalizando 36,7 milhões de beneficiários. O segmento representa o maior crescimento do setor: 3,4% na mesma comparação de tempo. Segundo Alessandro Acayaba de Toledo, presidente da Associação Nacional das Administradoras de Benefícios (ANAB) e advogado especialista em Direito e Saúde, os bons números representam um respiro importante para o segmento, mas há caminhos para um crescimento ainda maior, ao mesmo tempo em que a ANS se entusiasma com a edição de novas regras para os planos coletivos.
“Estamos vivendo um momento de extrema atenção na economia, aumento das taxas de juros e tímidas reformas econômicas que antagonizam com o crescimento de beneficiários nos planos de saúde. Por outro lado, temos a menor taxa de desemprego no Brasil em quase uma década, o que favorece o mercado e faz com que mais pessoas possam procurar um plano de saúde. Esse balanço demonstra a resiliência dos planos de saúde, que permanecem no pódio do ranking dos produtos mais desejados pelos brasileiros.”
Uma pesquisa divulgada em dezembro pela Associação Brasileira dos Planos de Saúde (Abramge), encomendada ao Instituto Datafolha, indicou que 94% da população que atualmente não possui esse tipo de serviço gostaria de ter. Entre os beneficiários, a maioria afirma sentir-se mais segura tendo acesso à saúde suplementar.
Esse resultado é semelhante ao levantado pelas duas edições da Pesquisa ANAB de Planos de Saúde. Em 2022, 83% das pessoas tinham medo de perder o plano e 47% dos entrevistados precisaram ajustar o orçamento para manter o benefício, de acordo com o estudo da ANAB feito em parceria com o Instituto Bateiah.
Judicialização e Normas Regulatórias são embates no setor
Apesar dessa perspectiva, há uma sensação agridoce que perpassa analistas que acompanham esse mercado. Isto porque, o mesmo setor que é campeão de acesso, também experimenta momentos contínuos de instabilidade e debates acalorados no Judiciário e na ANS, que envolvem rescisões unilaterais, reajustes nos planos coletivos e fraudes, provocando tensão entre os envolvidos.
Um levantamento realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), indicou que nos últimos quatro anos os processos de beneficiários de planos de saúde aumentaram mais de 50%. As operadoras de saúde são as principais acionadas e esse desgaste requer um olhar atento de todos, segundo o especialista.
“Ao mesmo tempo em que os planos de saúde se consolidam como produtos cada vez mais importantes para os brasileiros, as condições e desgastes impostos às operadoras estressam o mercado e causam disputas judiciais. É preciso um compromisso de todos os interessados na melhora na comunicação e no aperfeiçoamento das normas para equalizar a situação”, opina o especialista.
Apesar de muitas demandas judiciais terem fundamento e procedência importante, o especialista alerta para o crescimento da chamada “Judicialização Predatória”, casos em que se utiliza de um potencial direito conhecido para alcançar o maior número de decisões no mesmo sentido e acumular enriquecimento com base na mesma controvérsia originária.
“Essas demandas acabam transformando o sistema judiciário – já sobrecarregado com diversas outras demandas da sociedade – em um balcão de negociações entre consumidores e operadoras de saúde, desvirtuando sua finalidade. Tal prática se mostra como uma aposta lucrativa, com chances de obter honorários sucumbenciais altíssimos e indenizações a favor do cliente”, detalha.
Na esfera regulatória, a ANS está propondo mudanças significativas na regulação em várias direções. Em pouco menos de um ano, a Agência publicou quatro normas sobre o mesmo assunto – notificação por inadimplência. Esta nova regulação, com previsão de vigência a partir de dezembro próximo, cria enorme burocracia para punir o mal pagador, o que pode provocar maior reajuste.
A ANS também propõe um combo de resoluções normativas focadas em: (i) mudança no reajuste dos planos coletivos, para aumentar o número de beneficiários por agrupamento, atualmente até 30 vidas; (ii) mudança na nova política de preço e reajuste para contratos com fatores moderadores (coparticipação e franquia); (iii) obrigatoriedade de vendas on-line de planos de saúde; (iv) mudança nas regras de revisão técnica extraordinária nos planos individuais; e (v) mudança nas regras de cobertura dos planos ambulatoriais.
Todas as propostas têm pertinência por serem temas relevantes, mas diante do enorme grau de tecnicidade, complexidade e impacto para o consumidor, mereciam estar sendo tratadas individualmente, com o tempo adequado para que o mercado e a sociedade possam enriquecer o debate, contudo, percebe-se uma pressa para lacrar os assuntos.