Carnaval 2015 – É a maior festa do mundo. A partir de sexta-feira, até um milhão de turistas e quatro milhões de moradores locais vão sambar pelas ruas do Brasil.
Os banheiros sempre foram o maior problema logístico, porém este ano o Brasil enfrenta um desafio pesado: seca e escassez de água.
A escassez de água afeta o País mais do que a maioria dos países. Depois da China, o Brasil é o maior produtor mundial de energia hidrelétrica. Três quartos da energia daqui são produzidas em usinas hidrelétricas. E o consumo está crescendo – no ano 2050, o Brasil precisará de três vezes mais eletricidade do que hoje.
A seca atual ameaça especialmente as regiões e as cidades densamente povoadas no sudeste do Brasil: Rio e São Paulo. O sistema Cantareira está com apenas 5% da sua capacidade. Por todo o País, 17 das 18 usinas hidrelétricas mais importantes registram níveis de água mais baixos do que em 2001, o ano da última crise de energia, ou melhor, da crise hídrica.
A mudança climática significa que o Brasil está ameaçado por períodos de seca ainda mais frequentes. Catorze dos 15 anos mais quentes ocorreram desde o ano 2000. Segundo dados da Organização Mundial da Meteorologia (OMM), 2014 foi o ano mais quente desde que os registros climáticos começaram a ser feitos. À medida que o ar aquece, as temperaturas oceânicas também sobem, e isso pode ter um impacto considerável sobre o clima local e mais ainda sobre a precipitação de chuva. Algumas regiões tiveram chuvas torrenciais e inundações, enquanto outras regiões tiveram seca.
Em 2009, a Allianz e o WWF já haviam alertado sobre o ressecamento da floresta tropical amazônica no relatório sobre o clima intitulado “Pontos de Virada”. A expectativa do relatório é de que, no futuro, as secas regionais poderão ser dez vezes mais frequentes e também mais prolongadas, e isso se tornará a norma no ano 2050. A ocorrência de tais “pontos de virada” pode levar a mudanças irreversíveis com consequências dramáticas dentro de um curto período. As florestas atraem umidade, refrescam o ar e promovem precipitação de chuva. A imensa floresta tropical amazônica é considerada o ‘pulmão verde’ do planeta. No final deste século, períodos mais prolongados de seca poderão ameaçar até 70% da bacia amazônica. O desmatamento e os métodos de derrubada como as queimadas aumentam ainda mais esse risco.
Não só o Brasil, mas também outras regiões do mundo, são seriamente ameaçadas pela seca. Nos Estados Unidos, o sul da Califórnia, em particular, está em situação de risco. Nos últimos três anos, essa região recebeu um volume de chuvas anormalmente reduzido. Incêndios florestais devastadores se espalharam com velocidade apavorante no terreno extremamente seco.
Diferentemente do caso brasileiro, no entanto, lá as autoridades investiram desde o início em outras formas de geração energética além da hidrelétrica, de modo que o abastecimento de energia ao menos não foi diretamente afetado pela estiagem.
A mudança climática é agora a maior ameaça de longo prazo para empresas. A maioria delas já admitiu seu risco. Atualmente, o barômetro de risco da Allianz mostra que a mudança climática é, claramente, o risco empresarial de longo prazo número um para clientes da indústria. Os principais problemas de curto prazo são interrupções nas vendas e desastres naturais, sendo que nenhum deles pode ser nitidamente separado do outro ou dos eventos induzidos pela mudança climática.
A indústria do seguro é diretamente afetada pelas consequências das condições climáticas extremas, como secas e inundações, tempestades e ondas de calor. Desde os anos 1980, as indenizações de seguro relacionadas com a meteorologia aumentaram de uma média de $15 bilhões de dólares ao ano para mais de $70 bilhões ao ano atualmente.
As concessionárias de energia no Brasil lutam para lidar com as condições de seca. Elas precisam comprar eletricidade adicional nos mercados à vista para cumprir suas obrigações de entregar energia. Isso é muito caro, conforme a agência estatal de energia elétrica do Uruguai (UTE) aprendeu durante uma seca em 2012. A Allianz e duas outras seguradoras uniram suas forças ao Banco Mundial para desenvolver uma solução de seguro sob medida para a UTE. Para obter isso, os dados das precipitações de chuva de 39 estações meteorológicas são analisados diariamente. Assim que a precipitação de chuva cai abaixo de um limite predefinido, a UTE recebe pagamentos que podem chegar a $450 milhões de dólares, dependendo da gravidade da seca e do preço em vigor do barril de petróleo. Esses pagamentos dão segurança de planejamento para o orçamento nacional do governo e podem mitigar o aumento crescente nos custos da energia.
Na Europa, a meteorologia também causa problemas para muitas empresas. Chuva, neve e quedas bruscas na temperatura criam condições caóticas e sérias repercussões financeiras, como, por exemplo, quando as operações no Aeroporto de Heathrow, em Londres, ficam restritas por vários dias a fio. A meteorologia também pode gerar consequências menos espetaculares, porém não menos sérias sob o ponto de vista econômico para os produtores de energia renovável, sempre que o vento deixa de soprar e as turbinas eólicas não geram eletricidade suficiente. Seguradoras como a Allianz estão subscrevendo esses novos riscos. Os dados referentes a rendimento, gastos e produção são confrontados com dados meteorológicos para calcular um índice meteorológico. Quando o tempo fica instável, a apólice de seguro paga indenizações, favorecendo agricultores na Alemanha, empresas construtoras na Holanda e fornecedores de eletricidade na Grã-Bretanha.
As consequências da mudança climática irão catapultar muitos riscos hoje conhecidos para uma nova dimensão. Portanto, está se tornando mais importante para as empresas contratar seguro contra quedas no fornecimento de energia em regiões remotas e, sobretudo, vulneráveis, ao mesmo tempo em que elas também diversificam suas cadeias de suprimento em nível mais amplo. Por exemplo, quando a produção de minério de ferro declina no Brasil, que é o segundo maior produtor mundial, a produção de aço poderia ficar paralisada em muitas partes do mundo, levando a graves consequências para a indústria automotiva, a construção civil e as empresas de transporte.
Esperar que os representantes do governo continuem avançando nas suas negociações climáticas internacionais atrasa os investimentos necessários e tornando-os mais caros. Parcerias público-privadas podem ajudar, desenvolvendo abordagens inovadoras e mobilizando recursos financeiros. Por exemplo, o Brasil poderia gerar energia solar durante o dia e produzir energia hidrelétrica somente à noite. Por ser um País com o dobro de horas de luz solar do que a média na Alemanha em fevereiro, as luzes poderão permanecer acesas durante o Carnaval. Contudo, o tempo está acabando, pois o problema provavelmente virá novamente à tona, no mais tardar, com as Olimpíadas de 2016 – a não ser que chova bastante no País nesse meio tempo.
*Karsten Loeffler, CEO da Allianz Climate Solutions
Karsten Berlage, CEO da Allianz Risk Transfer