
Desde 04 de abril, quatro caravelas ecológicas inspiradas em barcos à vela repousarão sobre a Lagoa da Pampulha. Ao girar em torno do próprio eixo ao sabor dos ventos e das correntes, elas coletam dados sobre a qualidade da água e estimulam o crescimento de algas nativas, que desempenham um papel vital de oxigenação da água, de captura de CO₂ e de absorção de poluentes, como metais pesados e nutrientes em excesso.
Criadas pela startup Infinito Mare, as Caravelas são uma Solução Baseada na Natureza (SbN) para monitorar e despoluir rios, baías, lagos, represas e outros corpos hídricos de água doce e salgada. O termo SbN significa que a caravela contempla soluções que mimetizam pmigos,rocessos naturais e que usam a natureza como um ator na eficiência, beneficiando a sociedade, a economia e o próprio meio ambiente.
“As Caravelas são uma tecnologia que carrega séculos de sabedoria ancestral, de como diferentes povos ao longo de milênios já entendiam a água como um ser vivo, que se regenera por si mesmo. O poder das plantas de purificar é o nosso ponto de partida”, lembra Bruno Libardoni, oceanógrafo com Ph.D em geociências pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e CEO da Infinito Mare.
Por meio de uma parceria estratégica entre a Infinito Mare e a Zurich Seguros, a Pampulha foi escolhida como o cenário ideal para a implementação da tecnologia — seja por sofrer com o derramamento de esgoto nos córregos que desembocam na Lagoa, seja por conta da poluição difusa arrastada pela água das chuvas. A escolha também levou em conta a importância histórica e cultural da Pampulha para Minas Gerais, cuja identidade está intimamente ligada a seus rios, lagos e cachoeiras.
“Escolhemos trazer o projeto da Infinito Mare para Belo Horizonte por ser o berço de nossas atividades no Brasil, é um presente para a cidade. A Zurich é uma empresa que aposta na inovação, e queremos avaliar o poder das Caravelas como um instrumento prático e sustentável de despoluição das águas. Além disso as Caravelas são uma intervenção urbana e artística que cumprem um papel de conscientização da população, chamando a atenção para a importância da sustentabilidade e da preservação dos recursos hídricos”, pontua Lucía Sarraceno, diretora de Marketing, Clientes, Inovação e Sustentabilidade da Zurich.
Espaço tradicional de lazer dos belorizontinos, a Lagoa da Pampulha começou a sofrer os impactos da urbanização e da poluição principalmente nos anos 1980. Criada na década de 1930 a partir do represamento do ribeirão Pampulha, hoje ela abriga o Conjunto Moderno da Pampulha, idealizado por Oscar Niemeyer nos anos 1940 como uma obra de arte que integra arquitetura e natureza. Tombado pelo IPHAN em 1997 e reconhecido como Patrimônio Cultural da Humanidade pela ONU em 2016, o Conjunto é um dos principais cartões-postais do Brasil.
“As Caravelas não são apenas uma intervenção ambiental, mas uma manifestação da nossa capacidade de integrar ciência, arte e natureza de maneira inovadora”, destaca Luciana Batista, COO da Infinito Mare.
Mineira da cidade de Ipatinga, Luciana enxerga nesse retorno à capital onde viveu por anos uma oportunidade de ajudar a fortalecer a identidade mineira e sua relação com os cursos de água doce. “Para mim, retornar é uma chance de contribuir com a preservação desse patrimônio imaterial e material, oferecendo aos belorizontinos uma Pampulha mais limpa, mais conectada com sua história e com a sua alma”, diz.
A tecnologia por trás das Caravelas Ecológicas
Por meio da biorremediação com algas nativas, as Caravelas agem como ecossistemas flutuantes que, de forma natural e contínua, purificam a água ao absorverem nutrientes e poluentes. Inspiradas no comportamento da própria natureza, essas estruturas atuam como biomonitores ambientais que, além de limpar a água, possibilitam o monitoramento ambiental em tempo real. Na prática, as Caravelas funcionam como uma espécie de ímã que atrai o crescimento de algas nativas e promove a biodiversidade.
Adaptáveis e facilmente transportáveis, as Caravelas Ecológicas criam um ambiente onde organismos nativos crescem formando uma turfa de algas. Vale ressaltar que a tecnologia não introduz químicos ou espécies exóticas e é indicada para corpos d’água que recebem esgoto e nutrientes em excesso, já que as algas também capturam fósforo e nitrogênio, prevenindo a eutrofização e a proliferação de espécies tóxicas.
Colheitas periódicas das algas e análises dessa biomassa em laboratório garantem que a biorremediação possa ser controlada e continuamente estudada. Bruno Libardoni lembra que as primeiras análises permitirão entender como a Lagoa responderá à tecnologia e quantas Caravelas seriam necessárias para oferecer uma remediação mais efetiva.
As colheitas das algas ainda podem alimentar a economia circular, já que a biomassa coletada pode virar matéria-prima para biofertilizantes, biogás, biocombustíveis e outros produtos de alto valor agregado. Nesse contexto, as Caravelas também se alinham aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.
“A Caravela é como se fosse uma ilha que atrai poluição. Se esta ilha se conecta com outra ao lado, são duas Caravelas criando uma inteligência mais complexa sobre o ambiente”, acrescenta Libardoni, que enxerga neste pioneirismo uma saída economicamente viável, também, para a geração de créditos de carbono.
Isso porque o cultivo de algas pode se apresentar como uma alternativa eficaz no que diz respeito à pegada de carbono. Ao longo de um ano, cada Caravela pode compensar até 1 tonelada de CO₂e — o equivalente ao compensado por seis árvores em 20 anos.
Design poético e educativo
Por trás da inovação existe um design poético e educativo. Idealizada por Bruno Libardoni, a Caravela foi desenhada pela equipe criativa da Furf Design Studio e recebeu em 2018 o maior prêmio de EcoDesign do mundo, o Top Innovation Award, em Guangzhou, na China.
Com o objetivo de potencializar e de acelerar o crescimento das algas, sua rotação contínua oferece a quem observa a sensação de ver desde um barco à vela até uma imensa gota d’água. Enquanto geram curiosidade, esses diferentes olhares e significados trazem a pauta ambiental para o centro da conversa, cumprindo uma das missões da tecnologia: de educar e de conscientizar.
A tecnologia foi instalada em tamanho real pela primeira vez em dezembro de 2024, durante o Tomorrow Blue Economy, em Niterói, evento dedicado ao empreendedorismo no contexto da Economia Azul. Hoje, uma Caravela está ancorada na Marina da Glória, no Rio de Janeiro, onde coleta dados sobre a qualidade da água da Guanabara.
O apoio da Zurich
A relação entre a Infinito Mare e a Zurich se iniciou durante o último campeonato global de inovação da seguradora, o Zurich Innovation Championship, ocorrido em 2024, quando startups de todo o mundo foram convidadas a apresentarem as suas soluções para uma série de desafios enfrentados pela companhia, e foram avaliadas dentro de diversos critérios transversais, entre eles o da sustentabilidade.
Vencedora da etapa nacional do campeonato, a solução proposta pela Infinito Mare foi vista como estratégica pela unidade de negócios brasileira. A princípio, a parceria entre as empresas levará quatro Caravelas para a Lagoa da Pampulha, onde ficarão por 3 meses, período no qual as duas empresas estudarão os impactos da tecnologia na despoluição da lagoa.
“Além de estar em linha com a nossa estratégia de sustentabilidade, vemos a possibilidade de, no futuro, esta solução ajudar empresas ou instituições que atuem sobre a gestão de corpos hídricos, minimizando e prevenindo riscos. Será um período de aprendizado junto à Infinito Mare sobre a aplicabilidade dessa inovação nos negócios”, pontua Lucía. “A parceria também reforça o posicionamento da Zurich como uma empresa que busca a inovação para a solução de problemas complexos. Este é um objetivo totalmente conectado com a nossa marca, que visa uma nova geração de seguros, alinhada às necessidades da sociedade e do planeta”, finaliza a executiva.